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toni magni - interoperability infrastructure actor

2007-W50-2
2007-12-11 Tuesday

Desencontro

A story by Lina Magni

Eu, que te entendi como poucas outras pessoas te entenderam, e
menos ainda terão a possibilidade de te entender, Eu, que tanto te
prometi sorrisos, fortunas, e um futuro sossegado ao meu lado
Mesmo eu, que soube te enfeitar com promessas e carinho, nas horas
que você mais precisava-e eu as sabia reconhecer todas, e teria
querido poder faze-lo dia após dia.

Eu que não soube, talvez, pôr em palavras as intenções que, no
fundo do coração, residiam para com você. Mas sei que através do
meu olhar, eu tampouco soube esconde-las, e que você as viu, as
ouviu, as escutou, e deixou-as ressoar no espaço imenso que, no
coração teu, você estava reservando para mim.

Eu nunca quis acreditar que você pudesse me esperar tanto assim. E
nunca soube, direito, que podia existir um coração que pudesse,
até de longe, chegar a doer e a se doar tanto o quanto a dor
solitária mandava fazer com o meu. Cheguei a me contentar de
pessoas que, no pequeno amor delas, me puderam amar no máximo das
capacidades delas, que nunca ia ser igual ao que eu podia ter, mas
era um consolo por ser o máximo de alguma coisa.

Já com você, eu sentia restrições, obstáculos, e cheguei até a
pensar que, se você estava escolhendo se limitar tanto, era
porque, na verdade, o seu coração já pertencia a outro.

Mas te confesso que, nunca cheguei a achar o que eu encontro no
fundo do teu olhar, no olhar de outrem. E que, embora passei
esses últimos anos ocupado em esquecer, e em cancelar quaisquer
resquiços de sabor de ti por dentro das minhas narinas,
enraizado por dentro das minhas meninges, no fundo do sangue
preso da minha espinha dorsal, evitar de reconhecer a sensação
dessa luz por dentro de mim, ao te encontrar, nunca me será
fácil.

Foi assim que concordei em me afastar de ti.

Foi assim que você hoje chega para mim.

E chega singela, chega sem pretensões, chega como quem desce do
ônibus, solitário e de cabeça erguida, ainda grato por ter a
possibilidade de estar novamente em pé, e pronto para enfrentar
as mudanças, ventos e desafios que o ambiente novo trará. E você
chega, como sempre, bela.

Eu nunca me dei conta do quanto você tem chorado nesse
entretempo. A tua beleza ainda está contigo, a leveza, o
mistério bonito, nos teus traços. Mas os teus olhos falam
claro. Entendo agora que foram meses longos, e anos difíceis. E
eu, eu ainda não sabia. E tanto menos fazia idéia que a
saturação das tuas silenciosas lágrimas ia te levar até aqui, a
me enfrentar, muito antes que eu me desse conta do tudo, do
nada, do que minha falta de atitude tinha provocado em você.

Eu sei que você está aqui para ouvir uma razão. Para fazer tua, de
repente, uma desculpa qualquer, mas que mesmo uma desculpa qualquer eu
nunca te dei, para o que você passou.

E eu preciso afastar da minha cabeça a razão verdadeira, afastar
da minha consciência o que minha vida se tornou agora, e as
minhas responsabilidades, já tão longe de poder me permitir o
luxo de olhar novamente por dentro de você.

Preciso, sim, me recolher, voltar um pouco a reconhecer o menino
e o homem que eu sabia ser anteriormente, e te falar a partir
daquele meu lugar. Mas não consigo.

Houve, sim, umas mudanças comigo, e eu não espero que você
consiga entender. Houve sim, e há razões, pelas quais eu, mesmo
nessa data, mesmo com você aqui na minha frente, de olhos
molhados, nada poderei fazer para você. Te mandaria embora do
mesmo jeito que você chegou, mas essa vez, consciente que, com
esse ato, eu estaria matando, com golpe final, o pouco que
sobrou do maltratado coração teu.

Então se afaste de mim, por favor, para poupar o meu, e não peça
mais nada, não peça eu fazer algo desse, porque, do jeito que as
coisas estão, eu até seria capaz.

Me desculpe, se for possível fazer tanto, me desculpe para as
mágoas que eu te provoquei. Sei que promessa quebrada não tem
salvação, nem aqui e nem no além, e tanto menos tem desculpa,
por um coração tão puro quanto o seu. Sei que você acreditou
até agora na pureza do meu, e que com essa confiança, você nunca
parou de esperar, esperar que as minhas promessas se tornassem,
em um dia feliz, cheios atos meus.

Você não merecia tudo isso.

Você não merecia sofrer tanto.

E me parece, até, que minha alma se queixe, se requebre, se
recuse em admitir a covardia da realidade que estou forçando em
cima de você. Ainda tem um véu branco que me separa da realidade
dos delicados lábios teus, que só eles poderiam saber falar o
perdão, que somente deles viriam os conselhos de paz, de uma
vida mais luminosa, de meus atos mais assolariados. E não sei se
esse véu faz parte da áurea tua, tão luminosa perto de mim, o é
ainda coisa minha, cegando meus olhos em me afastando de tudo,
da verdade, do mundo, das possibilidades, da redenção, e de ti.

Mesmo assim, é tudo o que posso, te pedir de se afastar, e, se
puder continuar acreditando na pureza que, até um tempo atrás,
nós dois acreditávamos juntos, então vá, se consome nessa pureza
sua, e não venha procurar algo de mim--eu já perdi essa
confiança ha muito tempo atrás.

O amor somente flui livremente em um coração sem obstáculos,

Amor.

(Lina Magni)


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